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CESARE BATTISTI

CESARE BATTISTI
ÚLTIMO PRESO POLÍTICO NO BRASIL

sábado, 2 de julho de 2011

Desaparecidos




OS DESAPARECIDOS
De repente, naqueles dias, começaram
a desaparecer pessoas, estranhamente.
Desaparecia-se. Desaparecia-se muito
naqueles dias.

Ia-se colher a flor oferta
e se esvanecia.
Eclipsava-se entre um endereço e outro
ou no táxi que se ia.
Culpado ou não, sumia-se
ao regressar do escritório ou da orgia.
Entre um trago de conhaque
e um aceno de mão, o bebedor sumia.
Evaporava o pai
ao encontro da filha que não via.
Mães segurando filhos e compras,
gestantes com tricots ou grupos de estudantes
desapareciam.
Desapareciam amantes em pleno beijo
e médicos em meio à cirurgia.
Mecânicos se diluiam
- mal ligavam o tôrno do dia.

Desaparecia-se. Desaparecia-se muito
naqueles dias.
Desaparecia-se a olhos vistos
e não era miopia. Desaparecia-se
até a primeira vista. Bastava
que alguém visse um desaparecido
e o desaparecido desaparecia.
Desaparecia o mais conspícuo
e o mais obscuro sumia.
Até deputados e presidentes esvaneciam.
Sacerdotes, igualmente, levitando
iam, arefeitos, constatar no além,
como os pescadores partiam.

Desaparecia-se. Desaparecia-se muito
naqueles dias.
Os atores no palco
entre um gesto e outro, e os da platéia
enquanto riam.
Não, não era fácil ser poeta naqueles dias.
Porque os poetas, sobretudo
- desapareciam.
Se fosse ao tempo da Bíblia, eu diria
que carros de fogo arrebatavam os mais puros
em mística euforia. Não era. É ironia.
E os que estavam perto, em pânico, fingiam
que não viam. Se abstraíam.
Continuavam seu baralho a conversar demências
com o ausente, como se ele estivesse ali sorrindo
com suas roupas e dentes.

Em toda família à mesa havia
uma cadeira vazia, a qual se dirigiam.
Servia-se comida fria ao extinguido parente
e isto alimentava ficções
- nas salas e mentes
enquanto no palácio, remorsos vivos boiavam
- na sopa do presidente.
As flores olhando a cena, não compreendiam.
Indagavam dos pássaros, que emudeciam.
As janelas das casas, mal podiam crer
- no que viam.
As pedras, no entanto,
gravavam os nomes dos fantasmas
pois sabiam que quando chegasse a hora,
por serem pedras, falariam.

O desaparecido é como um rio:
- se tem nascente, tem foz.
Se teve corpo, tem ou terá voz.
Não há verme que em sua fome
roa totalmente um nome. O nome
habita as vísceras da fera
Como a vítima corrói o algoz.

E surgiam sinais precisos
de que os desaparecidos, cansados
de desaparecerem vivos
iam aparecer mesmo mortos
florescendo com seus corpos
a primavera de ossos.

Brotavam troncos de árvores,
rios, insetos e nuvens em cujo porte se viam
vestígios dos que sumiam.

Os desaparecidos, enfim,
amadureciam sua morte.

Desponta um dia uma tíbia
na crosta fria dos dias
e no subsolo da história
- coberto por duras botas,
faz-se amarga arqueologia.

A natureza, como a história,
segrega memória e vida
e cedo ou tarde desova
a verdade sobre a aurora.

Não há cova funda
que sepulte
- a rasa covardia.
Não há túmulo que oculte
os frutos da rebeldia.
Cai um dia em desgraça
a mais torpe ditadura
quando os vivos saem à praça
e os mortos da sepultura.
Affonso Romano de Sant'Anna

Tinha ordem para matar Zé Dirceu. E não cumpri"



“Herwin de Barros, ex-policial e agente da CIA que prendeu o então líder estudantil num Congresso da UNE, fala ao 247 e revela que irá processar o Estado brasileiro. Diz que foi perseguido por não executar seu preso mais "perigoso"


Claudio Julio Tognolli, 247

Herwin de Barros, o homem que prendeu Zé Dirceu no Congresso da UNE, fazendo uso de um ancinho, vai processar o estado brasileiro. Quer ser ressarcido. Quer aposentadoria de agente especial da Polícia Civil de São Paulo. Por quê? “Porque eu tinha ordens emanadas da CIA, a central de inteligência dos EUA, para assassinar Zé Dirceu. Não cumpri isso. E fui execrado. Em abril de 1984 mudaram até o regimento interno da polícia de São Paulo para que eu pudesse ser afastado. Tudo porque me neguei a assassinar friamente Zé Dirceu”, confessou Erwin ao Brasil 247.

A este repórter Herwin de Barros contou a história da encomenda da morte de Zé Dirceu, pela primeira vez, em agosto de 1998. Eu e Marcelo Rubens Paiva fazíamos então uma capa do finado caderno Mais!, da Folha de S. Paulo, intitulado “A Companhia Secreta”. Eram documentos, obtidos por Paiva, e trazidos à luz pública pela brazilianista Marta Huggins, mostrando a participação da CIA no movimento militar de 1964. Erwin resolveu contar tudo, pela primeira vez em sua vida. Desde então, seguiram-se capas e capas de revistas sobre sua vida. Agora dr. Erwin quer desabafar mais.

“Minha vida toda fui perseguido por agentes de segurança, que queriam saber de que lado eu afinal estava. Ninguém acreditava que eu não estava de lado nenhum. Em 1975 o SNI plantou duas mulheres lindíssimas em cima de mim, uma negra e uma loira. Deram em cima de mim para simplesmente saber qual era a minha ligação com as esquerdas”, revela Erwin.

Corria o ano de 1985. Um vetusto e poderoso delegado de polícia civil de São Paulo impede a entrada do advogado de Herwin na sala, para defender seu cliente. O advogado, fugindo do estrépito de rabugices do delegado, retira-se e bate a porta. Lá dentro, o delegado dispara a Herrwin, varado de ódio: “Agora você vai ver o que é bom, ninguém mandou ter ficado ao lado dos terroristas”. Mas: como um homem nada fácil, que é Herwin, amante das navalhas e armas brancas, agente do Dops, treinado pela CIA, a Central de Inteligência dos EUA, poderia ser acusado de tamanha postura?

“Paguei muito caro o preço por não ter torturado, espancado, ou levado armas automáticas para prender Zé Dirceu no Congresso da UNE de outubro de 1968”, confessa o hoje advogado Herwin de Barros.”

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